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Campanha em Erebor – Cena 8 – Thraurin Coração-de-Martelo

20/10/2013

Cena Anterior – Campanha em Erebor, Cena 7 – Falco

Pois bem, Dol Guldur.

Não sei o que uma antiga fortaleza em ruínas guardaria para nós, mas era a melhor pista que tínhamos do paradeiro de Ágrapo.

Finalmente deixamos as cavernas de Thranduil para trás, e fomos à leste, para sair daquela floresta maldita. Íamos fazer uma parada na terra dos beornings, conseguir algumas informações, descanso, comida e conselhos do Grande Urso para finalmente partir para a antiga torre do Necromante.

Muito diferente do que meu pai e meu tio relataram de sua visita à casa de Beorn no passado, a casa do gigante agora não estava mais solitária. A antiga paliçada, famosa pelos seus orcs e wargs pregados, não era mais o limite externo de seus domínios. Diversas casas foram construídas ao redor dela, e agora uma paliçada dupla, maior e mais alta cercava o território daquele novo povo: os beornings.

Beorn, fabio leone

Beorn, o Urso

Hardhart estava contente em voltar ao seu lar, e sua presença garantiu passagem livre de nossa estranha comitiva até o Grande Salão, o salão de Beorn.

– Hardhart! Que bom vê-lo pequeno urso!

Alguém que chamasse Hardhart de “pequeno” só poderia ser do tamanho de um olmo, e era justamente essa a altura de Beorn. Sua sombra se estendia por metade de nosso grupo, e apesar de sua idade obviamente avançada, sua ferocidade era visível em seus traços, agora abrandados pelo sorriso ao ver seu pupilo.

O abraço dos dois gigantes teria quebrado as costelas de um boi, mas Hardhart só sorria ao reencontrar seu mestre.

– Senhor, lhes apresento Qhorin e Thraurin de Erebor, Rowenna de Rhosgobel, Vir de Valle e Falco, do Condado.

– Olha só, não tinha olhado tanto pra baixo! Um novo coelhinho em minhas terras, quem diria? Será que seu apetite é tão grande quanto o do anterior?

Os olhos de Falco brilharam ao ver a referência a seu tio, mas aparentemente nossas mesuras não causavam qualquer comoção à Beorn.

– Já sei, já sei, serviços de suas famílias. O dia que eu quiser um muro de pedra eu vou ter uma pequena legião de anões e suas famílias pra vir aqui trabalhar pra mim. Deixem disso, vamos comer e celebrar a volta de Hardhart, Passo-de-pedra!

Sentamos na grande mesa de Beorn, e enquanto pôneis e cachorros gigantes traziam a comida, pude ver que o salão do Grande Urso havia mudado consideravelmente desde que meu pai estivera aqui.

A lareira ainda preenchia o centro da casa, com sua fumaça subindo pela abertura no teto do salão. Mas agora presentes vindos de diversos lugares eram observados ao redor dela. Entre eles um grande colar de conchas, um urso do tamanho de um anão feito de ônix negro, diversas ilustrações feitas em papel representando um urso grande esmagando orcs com suas garras, um cocar de penas gigantes que eu supunha vir das águias das montanhas…

Os móveis toscos de madeira ainda revelavam a simplicidade de Beorn, mas ele agora era um senhor dos homens, renomado entre humanos, elfos, anões e hobbits, e temido por qualquer criatura que tenha a sombra dentro de si. Este era Beorn, um herói vivo.

Guardei os detalhes na memória para poder contar para meu pai quando voltasse à Erebor. Tenho certeza que ele se alegraria em ouvir a descrição dali.

Comemos pão, mel e farinha, e após molharmos nossas gargantas com hidromel a conversa já estava bem descontraída. Beorn estava de ótimo humor, e conversava constantemente com Hardhart sobre o comportamento de suas abelhas gigantes.

Depois de um tempo porém, começamos a ficar calados e mantivemos nossos olhos em Qhorin. Nós precisávamos da permissão de Beorn para que Hardhart nos acompanhasse em nossa ida à Dol Guldur.

– Mestre Beorn, renomado entre todos os povos livres, agradeço muito…

– Fale mais alto anão!. Não precisa ter medo de assustar nenhum conselheiro de seu rei falando alto. Aqui na minha mesa falamos com voz de MACHO.

Dei um sorriso e olhei pra elfa, que evidentemente ali no grupo seria a única a não possuír voz de macho (bom, talvez Falco…). Subitamente senti um apreço muito grande por Beorn. O fato é que ele estava velho, e quis compensar sua surdez com uma piada. Estávamos entre amigos.

Qhorin então arrotou, bateu no peito e continuou:

– Justo. Mestre Beorn, serei direto e sem rodeios, sou…

– Um brinde aos discursos diretos! – riu Beorn enquanto levantava sua caneca de barro do tamanho de uma cabeça.

Brindamos e, meio sem graça, Qhorin continuou:

– Mestre, sou um artesão de Erebor, e planejo ir numa missão para reencontrar meu filho, Ágrapo. Não sou guerreiro, mas lutarei contra tudo e todos para cumprir o papel de pai. Precisarei de toda ajuda que puder dispor, e, com sua permissão, desejo a companhia de Hardhart, que consentiu em me acompanhar se o senhor permitir.

O clima ficou silencioso, e o único barulho que ouvíamos era um zumbido fraco de abelhas, vindo dos quintais da casa.

– E onde está seu filho, mestre artesão?

Qhorin engoliu seco e respondeu:

– Tenho razões para acreditar que o mesmo esteja na fortaleza de Dol Guldur.

Beorn se empertigou na sua cadeira, e seus olhos cansados faíscaram.

– A fortaleza está em ruínas, mas a floresta toda sente que algo está novamente morando ali. Todos os meus homens que foram investigar a fortaleza não voltaram mais. Vocês possuem algum plano? Algum mapa? Alguma dica de como conseguir invadir aquele lugar?

Silêncio…

– Temos toda a coragem do mundo, a amizade entre os povos e o amor de um pai.

– Não é suficiente. Hardhart não tem minha permissão, e se você não tem nada melhor a dizer, dou o assunto por encerrado. Não me darei ao luxo de perder Hardhart Passo-de-Pedra numa missão suicida.

Qhorin empalideceu. Sem Hardhart nossa missão parecia ainda mais impossível.

– Por favor Grande Mestre, o que podemos fazer para conseguir sua autorização? O senhor possui algum mapa ou dica para nos oferecer?

– Não.

Estávamos perdidos.

Rowenna então levantou, e pela primeira vez, fiquei feliz em ver ela se pronunciar.

– Peço permissão para falar, mesmo não tendo voz de macho.

Beorn dei um meio sorriso, assentindo com a cabeça. Rowenna falava mais alto do que o normal.

– Até onde sabemos, Mithrandir e o Conselho Branco foram os únicos que adentraram a Fortaleza do Inimigo. Desconheço o paradeiro do Mago Cinzento, mas sei de outro mago que pode nos ajudar. Meu Mestre Radagast mora há algumas léguas a sul daqui, sinto em meu coração que conseguiremos ajuda com ele. Se o Mago Castanho nos auxiliar, você promete autorizar Hardhart Passo-de-Pedra, a nos acompanhar? Conhecemos o valor dele em combate. Eu mesmo fui salva por ele pouco antes de chegar à Erebor.

Beorn não disse nada, mas olhou para a abertura no centro do teto de seu salão.
A lua brilhava forte, em sua fase crescente. A Constelação de Fole brilhava no céu (Águia para os humanos e elfos), e por um momento percebi que Beorn olhava fixo para ela.

Minutos se passaram, e o silêncio era perturbador.

– Sim, Hardhart os acompanhará se conseguirem a ajuda do Castanho. Sei sua história Rowenna Capa-Cinzenta, preciso ter certeza que você não esqueceu como é viver em comunidade. A falta de ação de um companheiro é fatal num combate.

Rowenna estreitou seus olhos e por um momento achei que ela xingaria Beorn. Mas ela relaxou seus músculos e sentou, quieta.

Qhorin voltou a falar:

– Então partiremos amanhã mesmo para Rhosgobel.

– Mas não todos. Hardhart, o hobbit e o moreno ficam. Além da ajuda de Radagast, quero ver se vocês anões e elfos conseguem ir e voltar sem se matarem no meio do caminho.

Recebi uma martelada no coração. Eu achava que Dol Guldur seria o pior dos desafios.

(…)

Chovia aos cântaros, e apesar das árvores altas e com copas largas, tínhamos pouca proteção. Até parecia que a chuva desviava dos obstáculos para encontrar nossa nuca e roupas de baixo.

Rowenna nos “guiava” através da floresta, mas vira e mexe mudava de direção abruptamente, muitas vezes fazendo-nos seguir por caminhos que já havíamos passado antes. A princípio eu e Qhorin não comentamos nada, mas depois de horas sendo ensopados, não resisti:

– Elfa, você tem certeza que sabe o caminho? Não é possível que seu mestre tenha se mudado ou algo do tipo? Obviamente você está perdida!

– Sim, ANÃO, eu tenho certeza que sei o caminho. E não, não é possível que meu mestre tenha se mudado. Sua casa fica em cima de uma colina, e não no topo de um ent que estica as pernas e vai para onde quiser!

Ela estava irritada.
Pelo menos isso me ajudava a tolerar a chuva.

– Mas pelo menos uma coisa que você disse faz sentido, eu realmente estou perdida.

– Rááá! Viu só?
E se você sabe o caminho, porque está perdida?

– Porque o caminho não está mais aqui.

Abri minha boca para falar, mas Qhorin me interrompeu.

– Tome o tempo que precisar Rowenna, se pudermos lhe ajudar em algo, nos avise.

– Sim, vocês podem. O silêncio prévio era excepcionalmente útil.

(…)

A chuva parou, mas o cheiro de mato molhado me incomodava. Que saudades das pedras secas de Erebor! Cada vez mais eu sentia uma coisa ruim naquela floresta. Já fazia tempos que não víamos animais, e Rowenna nos dissera que estávamos próximos tanto de Rhosgobel quanto de Dol Guldur, para tomarmos cuidado. Quando paramos para acampar, uma estranha criatura apareceu próximo a nossa pequena fogueira. Era como se fosse um pequeno humanoide, peludo e com dentes pontiagudos. Rowenna o chamou de “macaco”, mas disse que nunca havia visto um na Floresta das Trevas antes.

A presença dele me irritava, então comecei a arremessar pedras na sua direção. Os outros dormiam, e eu precisava de algo pra me manter acordado.

“Psss, xô macaco, vá procurar nozes em outro lugar!”

O bicho então sumiu, e fiquei mais calmo. Ele tinha um expressão maligna em seu rosto.

Alguns minutos se passaram, e um silêncio opressor começou a agir. Aquele silêncio antes da tempestade…

AUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU

Uivos. Merda!

– Qhorin, Rowenna, às armas!

Enquanto nos aproximávamos do fogo pude distinguir diversos olhos na escuridão. Lobos muito grandes aproximavam-se de nós.

Não sei porque, mas acreditei que aquilo era culpa do macaco.

Cada um de nós segurava sua arma, esperando pra ver o que aconteceria. Muitos pares de olhos se aproximavam, e estávamos totalmente cercados de lobos e árvores. Nossa parca fogueira se esforçava para iluminar nosso entorno, e a lua crescente contribuía aqui e ali entre as folhas. Mas o brilho mais forte ali era o azul do martelo de Qhorin.

Antes mesmo do ataque dos lobos, Qhorin saltou para o meio da escuridão:

“- Khazâd! Ágrapo!!”

O brilho azul explodiu na cabeça de um lobo, e sua pelagem branca manchou-se de escarlate, iluminado pelo brilho celeste da obra-prima do nosso povo.

A partir daí os movimentos foram rápidos, e um misto de gritos, uivos, rasgos, dentes e marteladas seguiram numa sequência turbulenta. E nem uma flecha. Nenhuma mísera flecha…

(…)

Quatro lobos jaziam ao meu redor, mas eu estava de joelhos. Minha coxa direita estava dilacerada, e meu martelo pesava na minha mão. Meu amigo Qhorin girava ao meu redor, afastando os lobos com o brilho azul e a força de seus braços.

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Eram muitos. E nós éramos apenas dois.

Um lobo saltou do meu lado, e sem forças pra levantar meu martelo, segurei-o com minhas próprias mãos. Sua boca rasgava minha pele, e seus dentes brancos brilhavam ao se aproximarem de meus olhos. Joguei meu corpo por cima dele, e sacando minha adaga no cinto, perfurei sua pele repetidamente.  Não tinha mais forças pra me levantar, e fiquei ali mesmo, caído.

Uma poça de sangue começou a brotar, feita de sangue anão e sangue lupino. A poça se unia às poças d’água ao redor. Eu estava boiando num lago, e meu bote era a carcaça perfurada de um lobo.

Tá aí um jeito inusitado de morrer!

Qhorin gritava o nome de Mahal ao meu redor, e meus olhos se fechavam. Comecei a ouvir passos de um monstro gigante se aproximando. Provavelmente um chefe warg atroz que viria mastigar nossas cabeças.

TUM TUM TUM TUM TUM TUM

Seus passos chegaram mais perto e a terra começou a tremer. Aquilo não podia ser um lobo.

RAAAAAAAAAAAAAAAWWWWWWWWRRRRRRRRR.

O lago ficou maior, pois, incontrolavelmente, comecei a chorar.

Mas não de medo.

O animal que chegou era um urso. Beorn.

Próxima Cena: Campanha em Erebor – Cena 9

5 Comentários leave one →
  1. 21/10/2013 14:45

    Cara, estava ansioso por essa pergunta. E ai como é jogar no sistema O um anel?

    Quanto aos relatos, nada de novo da minha parte, sempre muito bons, e muito bem escritos, um prazer de ler.

    Engraçado que estou ouvindo o nerdcast sobre os autores brasileiros e me pergunto, pq Chico e Gonçalo não lançam um livro? ^^

  2. 21/10/2013 22:22

    André, eu não sei exatamente como te dar essa resposta.
    Eu vou deixar pra te responder essa pergunta depois que a campanha acabar, acho melhor. Assim não corro o risco de afetar o andamento dela com a resposta que vou te dar. Peço que você seja um pouco de paciente com a pergunta dO Um Anel :P

    André, sobre seu comentário…
    Cara, eu fico até sem jeito de responder uma gentileza tão grande.
    Muito obrigado, do fundo do coração.

    Acho que não tenho uma resposta a altura, mas por hora digo que seu comentário despertou algumas engrenagens na minha e na cabeça do Gonça. Pode ser que você tenha dado uma faísca num palheiro que já há certo tempo deixou de ser úmido…

    Te deixaremos atualizados sobre isso, e continue acompanhando o blog!
    O próximo relato vai ser FENOMENAL. Abri mão de escrever ele com dor no coração, sabendo que seria magnífico retratá-lo. Foi uma das sessões mais incríveis que já joguei/narrei.

    Grande abraço meu amigo!

  3. gerbur12 permalink
    24/10/2013 13:01

    André, mais uma vez, muito obrigado.

    Fica até difícil agradecer elogios como esse.

    Por enquanto somos apenas blogueiros apaixonados pela Terra-Média e por RPG. Mas quem sabe no futuro não imprimimos e publicamos algo que seja realmente muito prazeroso de ler? Temos sempre, claro, o interesse de escrever cada vez melhor. E principalmente, temos o interesse de contar boas histórias. Esperamos a cada dia dar um passo a mais nesse nosso caminho.

    Mais uma vez muito obrigado, e até o próximo relato!

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